O rígido isolamento social está no centro da estratégia dos países da Escandinávia para enfrentar o coronavírus (é o que fez a abordagem dinamarquesa ser bem-sucedida, por exemplo). Esperamos que você esteja fazendo sua parte nesse esforço coletivo e ficando em casa. E, para que você possa relaxar e também enriquecer o espírito, o Scandinavian Way criou uma nova sugestão de programação para mais um fim de semana de pandemia: cinco livros gratuitos de autores nórdicos para ler na quarentena – e em português.
Com a crise do coronavírus, diferentes plataformas de literatura e comércio eletrônico de livros lançaram iniciativas para oferecer ao público, de graça, parte de seu acervo. Para fazer nossa seleção exclusiva, nós vasculhamos duas dessas plataformas. Parte da lista vem da Amazon, que anunciou a oferta de 50 mil e-books para baixar de maneira gratuita. Também fizemos a garimpagem na Scribd, uma biblioteca digital que funciona por assinatura e que está oferecendo 30 dias sem custos para novos assinantes.
Sobre nossa seleção
Escolhemos um autor de cada um dos cinco países nórdicos. Não faltavam opções para selecionarmos livros clássicos – afinal, Dinamarca, Finlândia, Islândia, Noruega e Suécia têm, somados, 16 ganhadores do Nobel de Literatura. Mas, em vez disso, optamos por escritores que estão na ativa. A ideia foi oferecer uma pequena amostra da elogiada produção literária da região na atualidade.
Mais dicas para a quarentena
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Nossa lista (abaixo) está em ordem alfabética. O nome do livro traz o link para o endereço em que ele está disponível gratuitamente. Escolha um, divirta-se – e faça um favor a você mesmo: saia um pouco do WhatsApp e das redes sociais.
Autor: Jussi Adler-Olsen
País: Dinamarca
Sobre autor e obra: Nos anos 90, os romances policiais se estabeleceram como o gênero de maior sucesso internacional da literatura nórdica. Muitas dessas obras se transformaram em matéria-prima de elogiadas produções de cinema e TV, o que levou o gênero – também chamado de noir nórdico – a novos públicos. O dinamarquês Jussi Adler-Olsen é atualmente um dos principais autores desse ramo literário.
Com A Mulher Enjaulada, ele abriu a série de grande sucesso Departamento Q, que já tem oito livros – o mais recente é de 2019. Publicada originalmente em 2007, a obra acompanha a investigação sobre o sumiço da líder política Merete Lynggaard. O caso é entregue ao detetive Carl Mørck, responsável pelo departamento que batiza a série e é especializado em casos importantes e não solucionados. Departamento Q também já deu origem a quatro filmes, e o quinto está em produção.
Trecho inicial: “Carl deu um passo em direção ao espelho. Colocou o dedo indicador na têmpora, sobre o local onde a bala passara de raspão. A ferida havia sarado, mas a cicatriz estava claramente desenhada no couro cabeludo, caso alguém se desse o trabalho de olhar. E quem diabos desejaria isso?, pensou, enquanto examinava seu rosto.”
A PRINCESA DE GELO
Autora: Camilla Läckberg
País: Suécia
Sobre autora e obra: Morto em 2015, o escritor sueco Henning Mankell era considerado o “pai do noir nórdico”, gênero em que ele mergulhou com a série de livros protagonizada pelo inspetor Kurt Wallander. E é também sueca uma das mais conhecidas autoras do gênero atualmente. Com mais de 20 milhões de livros vendidos em cerca de 60 países, Camilla Läckberg já foi chamada de “Agatha Christie da Suécia” – pelo tom envolvente de suas histórias sobre crime e também por seu sucesso comercial. Lançado em 2003, A Princesa de Gelo acompanha o detetive Patrik Hedström e a escritora Erica Falck na investigação sobre um suicídio que parece suspeito.
Trecho inicial: “A casa estava abandonada e vazia. O frio invadia todos os recantos. Na banheira tinha-se formado uma fina película de gelo. Ela tinha começado a adquirir uma ligeira tonalidade azulada. Ele pensou que, ali deitada, ela parecia uma princesa. Uma princesa de gelo.”
Autora: Emmi Itäranta
País: Finlândia
Sobre autora e obra: No extremo oposto da tensão e da violência dos romances policiais do noir nórdico, Memória da Água é um romance reflexivo, com elementos de ficção científica e a preocupação com as mudanças climáticas no planeta como pano de fundo. O livro, de 2014, é o primeiro de Emmi Itäranta, hoje uma das principais escritoras finlandesas.
A protagonista, Noria Kaitio, de 17 anos, narra a história em primeira pessoa. Em um futuro distópico, no qual as guerras são travadas por causa da água, Noria está para se tornar uma “mestre do chá”, figuras que conseguem localizar fontes de água escondidas. Quando seu pai morre, ela precisa decidir: revela a origem da água que abastece sua vila ou mantém o segredo e arrisca sua própria vida?
MINHA LUTA 1 – A MORTE DO PAI
Autor: Karl Ove Knausgård
País: Noruega
Sobre autor e obra: Karl Ove Knausgård é a maior estrela da literatura norueguesa na atualidade. A Morte do Pai é o primeiro dos seis volumes que compõem a série autobiográfica Minha Luta, que começou a ser publicada na Noruega em 2009 e deu ao autor fama internacional.
Com a brutal honestidade dos livros, o norueguês, então um escritor elogiado pela crítica, mas ainda de pouco sucesso comercial, tornou-se também um campeão de vendas. O jornal americano The New York Times chamou Minha Luta de “a primeira produção literária monumental do século 21”, e o britânico The Guardian de “a empreitada literária mais significativa de nosso tempo”. A série trouxe Knausgård ao Brasil em 2016, quando ele foi um dos principais nomes da Festa Literária Internacional de Paraty (Flip).
Trecho inicial: “Para o coração a vida é simples: ele bate enquanto puder. E então para. Cedo ou tarde, mais dia, menos dia, cessa aquele movimento repetitivo e involuntário, e o sangue começa a escorrer para o ponto mais inferior do corpo, onde se acumula numa pequena poça, visível do exterior como uma área escura e flácida numa pele cada vez mais pálida, tudo isso enquanto a temperatura cai, as juntas enrijecem e as entranhas se esvaem.”
PELA BOCA DA BALEIA
Autor: Sjón
País: Islândia
Sobre autor e obra: A trajetória de Sjón (lê-se “chion”) não tem nada de trivial. Ele já foi punk, poeta experimental, integrou um grupo artístico de inspiração surrealista, o Medúsa, escreveu peças teatrais e foi parceiro musical da estrela islandesa Björk. Na música, ele até concorreu ao Oscar de Canção Original em 2001 com Dançando no Escuro, filme do diretor dinamarquês Lars von Trier estrelado pela cantora. Mas foi com os romances que Sjón (abreviatura de seu nome de batismo, Sigurjón Birgir Sigurðsson) sedimentou sua verve artística internacionalmente – e até participou da Flip, em 2017.
Pela Boca da Baleia é um romance histórico que tem elementos de realismo fantástico. Nele, o autor recria a história de Jónas Pálmason, naturalista, poeta, cientista e curandeiro islandês que viveu no século 17 e foi perseguido sob acusação de feitiçaria. Pálmason recorda passagens dramáticas de sua vida, como as mortes de três de seus filhos, o exorcismo de um cadáver ambulante e o triste fim de um grupo de baleeiros espanhóis, massacrados pela população de uma vila pesqueira.
Trecho inicial: “Eu voltava da caçada. Na mão direita, levava a rede de caça; na esquerda, a lanterna. Na mochila, carregava a presa, um javali com dentes de aço, a enorme fera que andava solta pelos territórios do norte, causando muito estrago até ser descoberta e eu ter sido enviado para caçá-la. Não era o primeiro rebento da nortada que eu derrotara – o lobo chorador de leite, a lebre aquática de uma perna só, o alce do falo de ouro e a rainha das trutas peludas, todos esses já tinham caído na minha rede –, mas esse javali, com sua poderosa dentição, era com certeza a pior besta-fera já assoada pelo gélido nariz de Norðri, o anão do norte.”